Em trinta anos de carreira, Madonna desenhou uma linha tênue entre
arte e marketing. A menina que no fim da década de oitenta chocou a
mídia com o vídeo de “Like a Prayer”, falou o que tinha para falar sobre
religião e amor em um de seus álbuns mais aclamados. Não bastou naquela
época a cantora expor suas crenças religiosas, decidiu também falar de
sua família: a convivência com seu pai, a saudade de sua mãe e um amargo
divórcio com o ator Sean Penn. Sentindo assim uma inclinação para
tratar sobre o feminismo. Feminismo este que seria tratato em seu,
então, próximo álbum, Erotica.
Sob o disfarce de Dita Parlo, atriz
dos anos 30, Madonna preside Erotica com o chicote na mão e língua
plantada firmemente na bochecha. Se essa imagem parecia agressiva, até
este ponto, sua música estava quente e convidativa para cantar em pró do
feminismo, dos gays e da liberdade de expressão.
Anos depois, no
final da década de 90, Madonna desperta para sua maternidade e sua
espiritualidade às notas musicais sob produção de William Orbit. E por
essas e outras, não é à toa que ela é conhecida como a Rainha do Pop.
Dessa
vez ela está de volta com seu novo álbum: MDNA. Um anagrama simples que
sintetiza o peso de seu nome. Fácil de lembrar, com trocadilhos feitos
pelos fãs como Madonna’s DNA ou a sigla MDMA (como é
conhecido o ecstasy, na Europa). Mas ao ouvir o álbum, a mensagem é
clara: MDNA é o DNA de Madonna puro em letra e na maioria de sua
essência musical, com produção a cargo de: Orbit, Martin Solveig, Benny
Benassi e Demolition Crew.
O álbum é introduzido com a
canção “Girl Gone Wild”, produzida pelo italiano Benny Benassi, durante a
qual Madonna recita um ato de contrição sobre um violino criado por
sintetizadores. É apenas uma introdução bastante interessante e um ótimo
artifício reminiscente de “Like a Prayer” a “Confessions on a
dancefloor”. Com uma batida que não foge do convencional, "Girl Gone
Wild" tem apenas a relevância que tem por estar na voz de quem está, mas
poderia ser interpretada por qualquer outra pessoa.
Para
tratar dos assuntos mais pessoais, depois de mais de uma década, e com
um trabalho tão pessoal como MDNA, a participação de William Orbit não
poderia ficar de fora, já que a química musical entre os dois ficou
registrada em dois álbuns, Ray of Light e Music, para explorar seus
pensamentos mais íntimos e analisar os restos de seu segundo casamento.
Guitarra e violão fraturados, umas das marcas do produtor, chamam toda a
atenção em “I’m a Sinner”. E o vocal de Madonna em “Love Spent” é
suficientemente confiante para transcender a originalidade da música.
Não é só uma das músicas mais sofisticadas do álbum, é também uma das
mais relevantes. "I want you to take me like you took your money," ela
anseia.
O impacto sobre o divórcio com Guy Ritchie é
claramente óbvio na construção das letras e também na melodia. Tiros e
mais tiros de armas de fogo em “Gang Bang” e vontade de vingança. A
melodia ainda serve como lembrete de que o que separa Madonna da maioria
das outras estrelas da música pop é sua vontade de experimentar coisas
novas.
Mas, em “I Fucked Up”, Madonna mostra-se arrependida por
erros cometidos em um relacionamento. E assim, como todo ser humano é
contraditório com relação aos seus sentimentos quando “relacionamentos
conturbados” é o assunto. Madonna descreve, na música produzida por
Martin Solveig, suas maiores falhas no seu relacionamento e questiona se
um dia é capaz de reatar com o personagem da estória.
A
ironia de Madonna também está bastante afiada. Como em “Give me all your
luvin’”, com participação das rappers Nicki Minaj e M.I.A., onde a
cantora manda um recado a todas as cantoras do mainstream da atualidade:
“Eu sou um tipo de garota diferente – E vocês, quem são?”. Em “I Don’t
Give A”, outra canção do álbum com participação de Minaj, onde Madonna
diz estar nem aí para opinião alheia. Cá entre nós, uma mulher de 53
anos está pouco ligando para o que os outros pensam, não é mesmo? Com
uma batida um pouco r’n’b progressivo, assim digamos, essa canção é tudo
que o Hard Candy deveria ter sido.
Músicas como “I’m
addicted”, “Some Girls”, e “Turn Up the Radio” são cativantes mas que
acabaram não sendo distintas. Por outro lado, em “Falling Free”, o álbum
termina culminando com a voz limpa, meiga e bela de Madonna a
belíssimos acordes de violinos.
Diante de tanta inovação e
contribuição a cultura pop, ao longo de sua carreira, é naturalmente
cobrado de Madonna algo novo, algo jamais visto e ouvido, o que é somado
a sua inteligência e senso artístico fora do comum a escolha de
produtores desconhecidos em seus trabalhos. E tudo isso é somado a um
desespero por qualquer coisa nova que possa vir a aparecer na mídia e um
mercado carente de rostos novos na cena da pop music. Mas quem
disse que Madonna não pode resgatar e remexer seu próprio baú? Se a
cena dance já está tão ascendente no mercado musical como está hoje, o
que Madonna fez foi apenas lapidar e melhorar o que já existe, em seu
novo projeto. E fez tudo isso com a cara dela.
Para quem
interessar os números, até o momento em que escrevi essa resenha, MDNA é
um sucesso de vendas! Na pré-venda do álbum na internet, pelo iTunes,
dois milhões de pessoas compraram o álbum sem nem adivinhar o que
poderiam encontrar pela frente, e no dia de seu lançamento, 26/03, o
álbum atingiu o número #1 em 40 países. Em apenas dois dias, o álbum já é
disco de platina no Brasil.
Aos fãs da Rainha que
reprovaram seu último trabalho, digo: sintam-se recompensados! MDNA é
uma ótima surpresa que vale muito a pena! MDNA é o álbum que dá
continuidade ao seu legado! A mesma mulher que cantou a força feminina
há 20 anos atrás, mostra que ainda mantém firme seu pensamento coerente!
Encerro esse texto fazendo minha as palavras de Nicki Minaj em “I Don’t Give A”: There’s only one Queen, and that’s Madonna, bitch.
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